Resenha do livro O Som e a Fúria

Resumo do livro

Vou começar esta resenha com uma premissa simples, mas que define bem O Som e a Fúria: que leitura desafiadora! Acredito que poucos livros tenham se mostrado tão complexos quanto este clássico da literatura. Publicada em 1929, essa obra é considerada a mais significativa do autor norte-americano William Faulkner, que foi laureado com o Prêmio Nobel de Literatura em 1949.

Resenha do livro O Som e a Fúria

Entretanto, é importante destacar que esse desafio não significa que a obra seja ruim; muito pelo contrário! Se você aprecia literatura clássica e busca leituras que desafiem suas habilidades de compreensão, O Som e a Fúria é uma experiência imperdível. De acordo com o prefácio desta edição da Companhia das Letras, o romance surgiu durante um período de reclusão do autor, após a rejeição do seu terceiro livro por várias editoras. Abalado por essa situação, Faulkner decidiu investir em um estilo inovador, mesclando diferentes vozes narrativas e saltos temporais inesperados. Esta edição também traz a tradução de Paulo Henriques Britto e uma análise crítica de Jean-Paul Sartre, escrita em 1939.

Quando comecei a ler as primeiras páginas, confesso que fiquei assustada. Embora soubesse que o autor empregava a técnica do fluxo de consciência — uma abordagem também utilizada por Virginia Woolf e que remete ao Ulysses de Joyce —, nada poderia me preparar para o que estava por vir. Contudo, esse choque inicial logo se ameniza e, após algum tempo imersa na leitura, consegue-se entender e, principalmente, apreciar o estilo singular de Faulkner.

Mas, afinal, do que trata O Som e a Fúria? A obra narra a violenta decadência dos Compson, uma família aristocrática do sul dos Estados Unidos. Situada no final da década de 20, a história ecoa o preconceito racial e a xenofobia da época, refletindo a crise econômica que assolava o país, exibindo, assim, pobreza e desolação. A narrativa é conduzida por quatro vozes distintas: a primeira delas pertence a Benjamin, um dos filhos da família Compson, que enfrenta uma deficiência mental. Suas passagens são repletas de descontinuidades, com um entrelaçamento do passado e do presente, proporcionando uma visão do tumulto mental de um personagem confuso. Esta dinâmica torna a leitura bastante desafiadora, exigindo concentração.

A segunda voz narrativa é a de Quentin, outro filho da família Compson. Para mim, essa foi a parte mais complicada da obra, a ponto de quase abandonar a leitura. No entanto, é nesses momentos que a densidade do texto brilha, e reler é necessário. Quentin, ainda jovem, é enviado para estudar em Harvard, consequência da venda de parte das terras da família para garantir sua educação. Acompanhamos a sua rotina diária enquanto ele rememora frequentemente momentos significativos de sua infância, principalmente em relação à sua irmã Caddie, por quem possui um amor quase incestuoso. Faulkner faz uso de uma escrita que muitas vezes ignora a pontuação, o que requer um esforço extra por parte do leitor.

A terceira parte do livro é marcada pela perspectiva de Jason, o filho mais novo, que vive com a mãe D. Caroline e os empregados da casa, incluindo os negros Dilsey, T.P., Luster e Frony. Jason se destaca como um vilão memorável da literatura norte-americana, caracterizado por sua chantagem à irmã e seu roubo do dinheiro destinado à filha dela. É um personagem racista, misógino e agressivo, que frequentemente expressa sua revolta ao sentir que foi injustiçado pela própria família. Sua narrativa é mais direta e menos densa, mas não se deixe enganar; as emoções que ele evoca são conflituosas e desafiadoras.

Por fim, esperei que a última voz narrativa fosse a de Caddie, a filha Compson, mas Faulkner surpreende: a narração é feita em terceira pessoa e foca em Dilsey, a criada que funciona como a matriarca da casa, sempre rodeada por tragédias. É nesse segmento que Paulo Henriques Britto faz importantes observações sobre as interações entre personagens brancos e negros, cuja tradução para o português é digna de nota. Caddie e sua filha Quentin são personagens fascinantes, mas suas histórias são conhecidas apenas através dos relatos e lembranças dos demais personagens, sendo que suas vozes são de fato ausentes. O desfecho delas é fornecido no apêndice desta edição, e compartilho a impressão de que ambas eram mulheres à frente de seu tempo, enfrentando enormes adversidades na dinâmica familiar.

Vale mencionar que a análise de Sartre ao final do livro provoca uma reflexão intrigante sobre a temporalidade em Faulkner. O filósofo aborda cómo a literatura do autor parece aprisionar os personagens em um jogo incessante entre passado e presente, como se o futuro estivesse fora do seu alcance. Assim, enquanto lemos O Som e a Fúria, sentimos que a narrativa se desenrola como um eco de eventos já vividos, misturando a vivência no presente com memórias do passado. A passagem em que Quentin discorre sobre o relógio de seu avô ilustra bem essa ideia de que o tempo é uma ilusão.

Concluo esta resenha com uma citação de Macbeth, de Shakespeare, que ressoa profundamente em O Som e a Fúria: “O homem passa a vida lutando contra o tempo e o tempo o corrói como um ácido.” Faulkner nos leva a refletir sobre a futilidade dessa luta e sobre como tudo é absurdo: “A vida […] é uma história cheia de som e fúria, contada por um idiota e que não significa nada.”

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Minerva Sofia

"Oi, sou a Minerva! , uma leitora ávida e escritora dedicada. Com 25 anos, meu amor por livros me inspirou a criar este blog, onde compartilho resumos e resenhas sobre minhas leituras favoritas. Aqui você encontrará recomendações de livros, reflexões sobre temas importantes e minhas impressões sobre os personagens e enredos que mais me emocionaram. Se você é um amante de livros em busca de novas histórias para se envolver, junte-se a mim nesta jornada literária."

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